O Palhaço e o Publico

Se tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando, falei muitas vezes como um palhaço mas jamais duvidei da sinceridade da platéia que sorria.

Charles Chaplin

sábado, 9 de agosto de 2014

A Anarquia: um ideal de sociedade

Luc Spirlet
Instinto Coletivo



Etmologicamente, Anarquia é ausência de autoridade. Não é desordem como a maioria de nossos contemporâneos parece entender.

O deslize de significação foi provavelmente provocado pelo aspecto "irrealizável" de uma sociedade sem dirigentes. O homem tem essa atitude insuperável de ignorar o que parece impossível. E depois, um ideal, uma utopia, que ainda se preocupa com isso?

As teorias sociais demonstraram suficientemente que a coesão de um grupo e sua subsistência dependiam da comunidade dos objetivos. 

Além disso, o desconhecimento da utilidade prática dos ideias, e mesmo das utopias, posiciona o homem em um drama que se amplia em todas as camadas sociais. A droga, delinqüência, a corrupção,o desemprego, o quarto mundo, o despedaçamento das famílias são tantas manifestações do mal-estar geral. As declarações de inúmeras personalidades ressaltam, à medida dos seus desejos, a falta de ideal na juventude actual e na sociedade. 

Infelizmente, ninguém explica para que serve um ideal. Para que, com efeito, visto que não se o alcançara nunca ou raramente? Os que pensam isso na realidade estão diante da principal qualidade de um ideal. Quanto mais inacessível, mais ele é interessante para a sobrevivência de um grupo e mais chance ele tem de corresponder a uma unidade objetivo.

Com efeito, a ideia escolhe como objetivo dessa propriedade instalar uma tensão entre a realidade e o que deveria ser. É graça a essa tensão que encontramos heróis, pessoas fora do comum. Estas são capazes de exibir uma energia fora do comum. Estas são capazes de exibir uma energia extraordinária para avançar rumo a seu objetivo. Na confusão do mundo atual, elas olham para o ideal e servem-se dele como ponto de referência. O homem que perde seus sonhos é um homem morto. Nada mais o motiva para empreender o que quer que seja. 


A anarquia é, sem nenhuma dúvida, o mais belo sonho da humanidade, pois a ausência de autoridade supõe que cada ser tenha um nível de responsabilidade suficiente para dispensá-la. Imaginamos facilmente, então que o terrorista anarquista é um contra-senso pois ele justifica a razão de ser da autoridade e das prisões. 

Por sinal, qual dirigente colocará em obra os meios para dar ao homem mais responsabilidade, mais autodeterminação? Quem fará com que os habitantes de uma zona ponham-se de acordo para reparar as estradas ocupar-se da limpeza pública, distribuir a correspondência, transmitir informações vitais e ajudar os enfermos sem a intervenção de administrações pesadas e onerosas? Todos aqueles que se dedicam a preservar a vida ou a melhor-lá trabalham contra os interesses dos governos. Tão logo estes percebem o sucesso relativo de uma ação, eles a recuperam em seu benefício, glorificam-se, para em seguida servir-se dela como pretexto a nova tavas e regulamentos. Basta observar os movimentos ecológicos. 

Todavia, não nos queixamos! O imposto que pagamos nunca é apenas a responsabilidade que não assumimos. A Autoridade ou o que a representa encontra toda justificação na irresponsabilidade dos cidadãos. Se estes não querem que a sociedade desmorone, devem tomar seu destino em sua mãos, pois as coisas degradam-se e o Estado endivida-se, demostrando, assim, sua incompetência. 

Só nos resta a Anarquia para sairmos dessa situação. Devemos aprender desde já a viver sem autoridade. As pessoas já o fizeram tantas vezes. Isso porque a autoridade toma raramente a iniciativa de salvaguardar o que quer que seja. Na maioria das vezes, é o cidadão quem empreende, e a autoridade, ávida de eleitorado, continua. Mas não esqueçamos que o crime, o delito, a guerra e as querelas são os meios, perpetuados ou não pela autoridade, para justificar sua presença e o pesado tributo que ela cobra para sobreviver às nossas custas.

Traduzido do francês: Plínio Augusto Coêlho

sábado, 12 de julho de 2014

Ousar o Anarquismo

Instinto Coletivo

Federação Anarquista Francófona


"É a Anarquia!"

"É a Anarquia". A gente do poder a mídia utilizam em profusão e o termo anarquia para designar o caos econômico, político e moral de nossa sociedade. O emprego da palavra anarquia tenderia a fazer crer que esse mundo está entre às mãos de forças diabólicas que querem derrubar o belo edifício que os povos disciplinados, conduzidos pelos Estados, construíram no transcurso dos séculos. Todavia, são os Estados que partilham e governam o planeta, é a eles que se deve a desordem econômica na qual vivemos.

Fazer melhor que os Estados nos campos do caos e do horror é difícil... 

Quem ainda pode crer que o poder é sinônimo de organização? Aqueles que vivem do poder, certamente. Mas não os anarquistas. O caos institucionalizado, o poder e a escravidão estão superados. Hoje, escolher o anarquismo, é dar prova de realismo e senso organizacional. 

Nossos detratores (dos fascistas aos marxistas, passando pelos democratas) consideram-nos como terroristas ou idealistas em atraso de uma revolução. Também há aqueles que sustentam defender o anarquismo, mas que preconizam uma sociedade, sem regras, sem moral, sem comedimento, no qual poder-se-ia fazer o que se quisesse. Que escolha o cidadão razoável poderá fazer entre as proposições de autoritários. Que escolha o cidadão razoável poderá fazer entre as proposições de autoritários de todos os tipos que mostraram sua falência, e aquelas dos niilistas de todos os calibres que sustem que amanhã tudo será varrido, resolvendo-se tudo pela supressão pura e simples de todas as instituições postas em prática até hoje?

O pensamento libertário engloba um projeto de sociedade diferente de todos os modelos conhecido até o presente.

A Anarquia é o estado de uma sociedade, ou mais precisamente, de um meio social sem governo. Exceto os anarquistas, todos os filósofos, todos s moralistas, todos os sociólogos, inclusive os teóricos democratas e os doutrinários socialistas, afirmam que na falta de um governo, de uma legislação e de uma repressão que assegure o respeito da lei e puna toda infração a esta última, não pode existir se não desordem e criminalidade. Os anarquistas afirmam que "a Anarquia é a mais elevada expressão da ordem".


Anarquia e ordem?

Nossa ideia de ordem repousa no entendimento (princípio de liberdade, oposto ao princípio de autoridade)  e no apoio mutuo (princípio de cooperação oposto ao princípio de competição).

Ao contrário, as outras proposições de organização da sociedade - socialismo, liberalismo, marxismo - sempre concederam a uma minoria de privilegiados o direito de gerir a sociedade no lugar dos concernidos e em seu próprio proveito. Esse modo de gestão porta um nome: Estado.

O Estado é a expressão política do regime econômico ao qual está submetida a sociedade. Ele permite e justifica a opressão e a exploração do homem pelo homem: ele confisca ao indivíduo seu poder - tanto em ditadura quanto em democracia (eleições) - e põe esse poder a serviço do capital (repressão dos movimentos sociais, ajuda financeiras...)

O Estado, à força de ser onipresente, acaba superpondo-se à sociedade, e tenta fazer crer que, sem ele, ela não poderia funcionar. Essa ilusão é ainda mais patética porque o Estado constitui, de fato, um grupo social à parte inteira, separado das realidades dos indivíduos e dos outros grupos sociais. Ele só serve para manter a ordem (funções legislativa e repressiva) a serviço dos interesses da classe exploradora, que se a denomine patronato, burguesia ou nomeklatura. 

Ele se apoia, para isso, numa moral degradante e humilhante para o ser humano, secundado, nesse sentido, pela religião que legitima, ela também, a exploração e a dominação, contentando-se às vezes em condenar as manifestações mais brutais, sem jamais emitir crítica de fundo nem propor outro modelo senão o patriarcal, conservador, hierárquico e caritativo. 


Os anarquistas recusam esse modelo societário, opressor, explorador, negação do indivíduo e de suas aspirações. Eles buscam por todos os meios mostrar que é possível e desejável viver numa sociedade igualitária, gerida direta e livremente por seus grupos sociais, econômicos, culturais, e isso no âmbito do federalismo libertário.


A recusa da autoridade 

A recusa da autoridade não surgiu com as teorias libertárias. Elas as precede amplamente através dos atos, das atitudes de indivíduos ou de grupos sociais. Alguns acontecimentos históricos no-lo recordam: por exemplo, as revoltas dos escravos na Roma antiga, as jacqueries camponesas da Idade Média, o desenvolvimento do Renascimento, os filósofos das Luzes, a Revolução francesa. Mais perto de nós, essas teorias participaram do desencadeamento da Revolução de 1848, da Comuna de Paris, da Revolução russa e da Revolução espanhola. Tantos lugares, situações, nos quais homens buscaram distender e até mesmo abolir o círculo opressivo no qual eles se sentiam presos.

Ressituando esses acontecimentos no contexto histórico e social que lhes deu origem, percebe-se que eles visam a um mesmo objetivo: a melhoria das condições de existência, a partilha das riquezas, o direito ao conhecimento, a instrução, o bem-estar em resumo, uma aspiração à felicidade. 

Esses movimentos de revolta foram em sua maioria esmagados (os escravos, os camponeses, a Comuna de Paris), ou recuperados em proveito uma classe ou de um partido (a burguesia emergente sob a Revolução francesa, os bolchvicques na Revolução russa), ou ainda desviados de seu objetivo (os monarcas ditos "esclarecidos" dos Século das Luzes). Pois malgrado o embrião de liberdade que continham, eles não eram suficientemente fortes nem estruturados para alterar o curso das coisas. Eles eram utopias no sentido em que ousaram projetar na tela do futuro imagens em contradições com aquelas de seu tempo. 


Heranças 

Essa herança filosófica foi teorizada, depois colocada em prática no século XIX, depois colocada em prática no século XIX, coincidindo nisso - e não sem razão - com o surgimento do nacionalismo e do estatismo.

Hoje há concordância em dizer que Pierre-Joseph Proudhon é o "pai" do anarquismo, o teórico do sistema mutualista e do federalismo, e o inspirador do sindicalismo operário. Sua influência sobre o movimento operário, foi real, visto que no seio da Associação Internacional dos Trabalhadores (A.I.T) existia uma corrente nitidamente proudhoniana. 

O Congresso de Saint-Imier (1872) deita as bases do anarquismo. Os delegados reunidos proclamam "que a destruição de todo poder político é o primeiro dever do proletariado", "que toda organização de um poder político pretensamente provisório e revolucionário para conduzir essa destruição só pode ser uma enganação e seria tão perigosa para o proletariado quanto todos os governos hoje existente...".

Essas ideias tomadas de Mikhail Bakunin  e da Primeira Internacional, permanecerão presentes até os nossos dias. Elas serão o apanágio de Louise Michel (Comuna de paris), do 1º de Maio de 1885 (Estados Unidos), de Fernand Pelloutier (Bolsas do Trabalho), das explicações do mundo de Élisée Reclus, eminente geógrafo, de Pierre besnard (anarco-sindicalismo), de Piotr Kroupotkin e do comunismo libertário de Paul Robin e de sua escola libertária de Cempuis, de Jean Grave e de seus quarenta anos de propaganda anarquista, de Gustave Landauer, fuzilado pela soldadesca em 1919 por sua luta ao lado dos Conselhos Operário de Baviera, de Nestor Makhno e de seu engajamento na revolução russa, de Sacco e Vanzetti, assassinados na cadeira elétrica por suas ideias, de Erich Mühsam, poeta e dramaturgo alemão, morto num campo de concentração em 1933, de Buenaventura Durruti durante a guerra da Espanha, de Armand Robin e suas línguas múltiplas, para só citar alguns.

Após a Segunda Guerra Mundial, elas ressurgirão e verão a criação da Federação Anarquista Francófona, da Internacional das Federações Anarquistas no mundo; elas impulsionarão a reconstrução da Confederação Nacional do Trabalho, anarco-sindicalista, filiada à A.I.T., elas soprarão brisas em Maio de 68 e da contra-cultura, no movimento social... 


Da anarquia ao anarquismo

Assim, a Anarquia é o que entrevemos (sociedade libertária); o anarquismo é o movimento social que persegue a realização do ideal anarquista. O anarquismo é uma luta incessante, sob as formas mais variadas, contra os preconceitos, o obscurantismo, o fato autoritário. Ele articula-se principalmente em torno de dois tipos de tarefas: umas destrutivas, as outras reconstrutivas. As ações destrutivas consistem a minar profundamente o princípio de autoridade em todas as suas manifestações, desmacará-lo, combater todas as manobras pelas quais ele tenta reabilitar-se e sobreviver sob uma outra forma. As ações reconstrutivas, ás vezes paralelas às destrutivas, visam por prática um funcionamento federalista e de gestão direta. Para isso é preciso um instrumento adaptado, uma organização... 

Organização 

A organização é função de grau de consciência, alcançado pelas discussões, debates e confrontação de ideias, e na ação. Quanto maior essa consciência, mais elevada será a vitalidade da organização. Para chegar a uma organização flexível e forte, ao mesmo tempo conforme ao espírito libertário, é preciso ir da base ao cume, da unidade ao grupo, do particular ao coletivo. Nós nos colocamos em concordância entre indivíduos e grupos sobre um conjunto de princípios generosos de concepções fundamentais e aplicações práticas: é o federalismo que permite a cada um permanecer ele mesmo, conservar sua autonomia, tomar parte ativa na vida da organização deixa a cada um de seus elementos a totalidade das forças que lhe são próprias, enquanto que pela associação dessas forças, ela alcança sua vitalidade máxima. 


Ação 

Ação não é agitação. Ela deve corresponder a um objetivo, a revolução libertária, e a uma estratégia, mais circunstancial. Às vezes, a situação social é provisoriamente calma, às vezes ela se agita. A organização deve adaptar-se a essas diferentes fases. De qualquer maneira, o lugar dos militantes anarquistas é na luta social, expressão de luta de classes, inclusive nas lutas  ditas reformistas (luta contra a precariedade, contra as demissões, pelo aumento salarial, defesa dos serviços públicos...), com nossas práticas antiautoritárias e de ação direta (controle e revocabilidade dos mandatos...),  e nossas perspectivas de conjunto.

É da confrontação entre nossas ideias, nossas práticas, e as massas que pode surgir ou nascer progressivamente a consciência revolucionária. 


Proposições 

O anarquismo, enfim é um conjunto de proposições e práticas tendendo à emancipação total do homem em sociedade. Se a sociedade existe como entidade sociológica, o indivíduo existe também, sem relação hierárquica com essa sociedade. É, portanto, a harmonia entre esses dois elementos que os anarquistas buscam. 

A emancipação é de tripla natureza. Emancipação econômica de início, pela reapropriação dos instrumentos de produção, sua gestão diretas pelos próprios trabalhadores, e pela repartição igualitária das riquezas. 

Emancipação política em seguida pela substituição da burocracia de Estado por uma organização federalista dos setores da sociedade, mantendo a coesão e preservando a autonomia. 

Emancipação intelectual, enfim, via gestão pelo indivíduo de seu papel social, relegando a religião e toda forma de submissão ao museu dos horrores. Uma socidade sem classe e sem Estado, organizada por e para mulheres e homens, eis o que quer o anarquismo. 

O anarquista é por temperamento e por definição refratário a toda arregimentação que trace ao espírito limites e cerceie a vida. Ele nega o princípio de autoridade para organização social. Assim, não pode haver catecismo libertário. 

A organização anarquista da sociedade, emanação direta da vontade dos indivíduos e dos grupos sociais, só poderá realizar-se for e contra a tutela de todos os organismo e estruturas autoritários estabelecidos sobre a desigualdade econômica e social. 

Os fundamentos éticos e orgânicos do federalismo libertário são: a liberdade como base, a igualdade econômica e social como meio, a fraternidade como objetivo. Essa definição marca a profunda diferença entre o federalismo libertário e o "federalismo estatísta". 

Aspiramos com todas as nossas força a uma sociedade de tipo federalista, fundada na posse coletiva ou individual dos meios de produção e de distribuição (excluindo toda possibilidade para alguns de viver do trabalho alheio), o apoio mútuo, a abolição do salariado e da exploração do homem pelo homem. 

Os anarquistas não concedem nenhum crédito a uma simples mudança das pessoas que exercem a autoridade: as mesmas causas engendram os mesmo efeitos. Todas as formas de autoridade equivalem-se. Deixar subsistir uma única, é favorecer o reaparecimento de todas. 


Rumo a uma sociedade libertária 

Para chegar a instaurar uma sociedade libertária, é preciso dotar-se de meios em concordância com a finalidade. Tal como exprime Errico Malatesta, "esses meios não são arbitrários, eles derivam necessariamente dos fins a que se propõe e das circunstâncias nas quais se luta. Ao equivocar-se quanto à escolha ds meios, não se alcança o objetivo esperado, mas, ao contrário, distancia-se dele, ruma a realidade amiúde opostas, e que são a conseqüência natural e necessária dos métodos empregados".

É possível viver numa sociedade igualitária, gerida direta e livremente por seus diversos por seus diversos componentes (indivíduos, grupos sociais, econômicos, culturais, étnicos...) no âmbito do federalismo.

As regras que farão funcionar tal sociedade têm por base contratos mútuos, igualitários, recíprocos, podendo ser reavaliados a todo instante. Esse contratos podem ser escritos ou tácitos.


Mandatos

Tal sociedade não pode evidentemente funcionar sem apoio mútuo e sem cooperação voluntária. A delegação de responsabilidade permitirá discutir em nível federal. Todavia, atenção, entendamo-no quanto às palavras: para os anarquistas, cada delegado recebe um mandato preciso. A assembleia que o mandatou exerce um controle permanente sobre seu trabalho, e, sobretudo, pode revogá-lo a qualquer momento se o trabalho que ele efetua não corresponde a seu mandato. 

O anarquismo é uma proposição global de sociedade buscando promover uma civilização realmente diferente. Ele opõe e o princípio de liberdade ao princípio de autoridade, o apoio mútuo à lei da selva, igualdade à discriminação. "Enquanto a sociedade tiver por base a autoridade, os anarquistas permanecerão em estado perpétuo de insurreição" (Élisée Reclus).


Traduzido do francês por Plínio Augusto Coêlho 






terça-feira, 3 de junho de 2014

§ 150

Instinto Coletivo


O consolo mais eficaz em toda infelicidade, em todo sofrimento, é observar os outros, que são ainda mais infelizes do que nós: e isto é possível a cada um. Mas o que resulta disto em relação ao todo?

Parecemos carneiros a brincar sobre a relva, enquanto o açougueiro já está a escolher um ou outro com os olhos, pois em nossos bons tempos não sabemos que infelicidade justamente agora o destino nos prepara - doença, perseguição, empobrecimento, multilação, cegueira, loucura, morte, etc.

A história nos mostra a vida dos povos, e nada encontra a não ser guerras e rebeliões para nos relatar; os anos de paz nos parecem apenas curtas pausas, entreatos, uma vez aqui e ali. E de igual maneira a vida do indivíduo é uma luta contínua, porém não somente metafórica, com a necessidade ou o tédio; mas também realmente com outros. Por toda parte ele encontra opositor, vive em constante luta, e morre de armas em punho. 

Schopenhauer (Contribuições à Doutrina do Sofrimento do Mundo)